Entrevistas
Conheça Vick...
Me chamo Victória, tenho vinte e um anos e sou cadeirante de nascença. Nasci com com mielomelingocele. Sempre tive que lutar e continuo lutando todos os dias, pois ser cadeirante é uma luta diária. Principalmente se você for mulher.
Quando criança, sofria com o bullying constante na escola, sendo chamada de aleijadinha por exemplo. Era normal as crianças evitarem fazer duplas comigo nos trabalhos, com medo da minha deficiência prejudicar elas de alguma forma. Nas aulas de educação física, quase sempre eu tinha que fazer dupla com a minha professora. Na época, minha inocência me impedia de ver o que estava acontecendo, mas hoje sinto tristeza quando lembro. Uma vez, no maternal, esqueceram de mim em uma atração chamada “a casa da bruxa”. Como ainda não tinha operado a coluna, ainda conseguia engatinhar então foi isso que eu fiz pra fugir daquela risada macabra que preenchia o lugar. Engatinhei morro abaixo, ignorando galhos, pedras e espinhos pelo caminho.
Quando fiquei mais velha, tive que lutar pela confiança da minha família para poder sair. Só queria sair com as amigas pela cidade como qualquer adolescente. Mas eu não me sentia normal. Nunca fui alvo de olhares nem cantadas como as outras meninas e eu desejava isso, por mais que hoje tenha noção de como isso é repulsivo. Mas na época só queria ser vista como mulher, e não simplesmente, ignorada como acontecia.
Hoje em dia tenho um namorado andante, mas por incrível que pareça sempre me perguntam se ele é cadeirante também. Parece que é difícil para as pessoas imaginar alguém que sinta atração, que queira ter um relacionamento sério com uma mulher com deficiência. Felizmente, temos uma vida ativa juntos, vamos a bares, festas e fazemos viagens juntos, enfrentando todo tipo de dificuldade de locomoção, desde ônibus sem acessibilidade até motoristas de aplicativos perguntando se a cadeira vai junto.
Nós, mulheres cadeirantes, somos 14% da população brasileira. Sofremos um duplo preconceito, por ser mulher e por ser cadeirante. Acredito que é fundamental que lutemos para nos fazer ouvir diariamente, para construirmos um mundo melhor para nós mesmas e para as mulheres que virão depois de nós. Um grande homem disse uma vez que só a luta muda a vida e concordo muito com ele.
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