Em cadeiras de rodas, a dança os liberta. Percebem que suas limitações no compasso da dança se transformam em possibilidades.  Deslizam. Flutuam. E dançam. Todo sábado o projeto ‘Dançando com as Diferenças’ do Centro de Educação Física e Desportos (CEFD) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) ensina a seus alunos que a dança depende mais da vontade que do movimento das pernas.
O ‘Dançando com as Diferenças’ surgiu no segundo semestre de 2001 quando Caren Bernardi, bailarina e acadêmica do Curso de Fisioterapia da UFSM, conheceu o trabalho do Grupo Roda Viva de dança em cadeira de rodas, reconhecido nacionalmente. Caren procurou o auxílio da professora doutora Mara Rubia Antunes e, juntas, colocaram em prática um projeto semelhante no Centro de Educação Física e Desportos da UFSM. O projeto é, desde então, coordenado pela professora e propicia a experiência da dança para pessoas portadoras de necessidades especiais.
O ‘Dançando com as Diferenças’ funciona aos sábados no Ginásio Didático II do CEFD. Durante as tardes os alunos são apresentados ao mundo da dança. Eles aprendem desde os elementos específicos da arte até coreografias temáticas. Este ano o grupo trabalhará com os ritmos brasileiros.
O projeto se sustenta com os recursos liberados pelo CEFD. Entretanto, para participar de alguns eventos, o grupo promove a venda de rifas para arrecadar verbas que possibilitem o pagamento das viagens.


Grupo reunido em mais uma tarde de ensaios. Créditos: Gabriela Moraes.

Atualmente, são dez os participantes do projeto, entre crianças, jovens e adultos. O transporte cedido pela Pró-reitoria de Extensão da UFSM se encarrega de levá-los até o Ginásio. O transporte segue praticamente a mesma rota do ônibus T. Neves, pois no bairro é onde se concentram na cidade, o maior número de participantes.
Recentemente, o projeto tem encontrado algumas dificuldades com a questão do transporte. Como o coletivo segue uma rota, qualquer participante que não esteja incluído nela tem dificuldades em chegar ao local do projeto. “Recentemente um menino que mora fora de nossa rota entrou no projeto. Felizmente, conseguimos fazer com que a família dele leve-o até a casa de um dos outros meninos, então conseguimos buscá-lo”, destaca Mara.
Outro problema com o qual os jovens do ‘Dançando com as Diferenças’ tem de lidar diariamente é a questão da acessibilidade. “O CEFD não possui nenhum banheiro adaptado”, lamenta a professora. As rampas foram construídas recentemente e a dificuldade de acesso dos cadeirantes foi atenuada. Contudo, ainda há muito no que investir.
Além disso, a infraestrutura da cidade deixa muito a desejar. “Recentemente a cidade começou a abrir espaço para projetos como o nosso, mas, infelizmente, ela não está preparada”, comenta Mara. Transportar os cadeirantes a teatros e palcos, por exemplo, onde não há elevadores ou rampas, é uma tarefa árdua. “O Theatro Treze de Maio tinha elevador, mas ele não funcionava. Depois que começamos a nos apresentar lá é que a situação mudou”, diz a professora.
Os problemas enfrentados pelos participantes do projeto ‘Dançando com as Diferenças’ são as mesmas dificuldades enfrentadas por milhões de pessoas portadoras de necessidades especiais do Brasil. Encontrar soluções para essas dificuldades e apoiar projetos como os desenvolvidos no CEFD é um grande passo na conquista de uma sociedade mais igualitária, que avalie as pessoas pelas suas possibilidades e não pelas suas limitações.
Voar é possível, basta uma pitadinha de pó de pirlimpimpim
“Um, dois, três, quatro. Girinho, girinho. Roda. Um, dois, três, quatro. Gira, gira. Segue a roda.” A voz de comando vai ecoando de tempo em tempo pela sala abafada do Ginásio Didático do Centro de Educação Física e Desportos (CEFD) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). A voz se mistura com o ritmo inconfundível de “I Will Survive”. Os pequenos-grandes olhos que a tudo querem ver ficam atentos aos comandos. A concentração está por toda parte. É sábado, mais um dia do ensaio do grupo de dança em cadeira de rodas ‘Dançando com as Diferenças’.  A voz de comando é a da professora doutora Mara Rubia Antunes, coordenadora do projeto. Mas, essa não é a única voz que se pode ouvir por aqui. As acadêmicas da área da Educação Especial, da Pedagogia e da Educação Física, além de outras duas professoras, também da Educação Física, entram na dança. Aqui, não basta apenas ensinar, tem de participar, fazer parte do show.

Professora também entra na dança. Créditos: Gabriela Moraes.
O ritmo acompanha a música, e o corpo, mesmo com limitações, dança. O que era pra ser um simples ensaio, emociona e encanta. Para Ane Arruda, 9 anos, Fabiele dos Santos, 14 anos, Jonathas Pompeu, 10 anos, Lisiane Dias, 22 anos e Marcos Brandão Júnior, 15 anos, alguns dos dez participantes do projeto, as cadeiras de rodas são asas, e para voar basta fazer de conta e usar a imaginação. Quando dançam tornam-se leves como bolhas de sabão boiando no vento.

Marcos, Ane e Fabiele se divertem dançando I Will Survive. Créditos: Gabriela Moraes.
No ano passado, o grupo levou sua graça e leveza para se apresentar na Mostra Internacional de Dança em Cadeira de Rodas de Juiz de Fora, Minas Gerais. Essa foi a segunda vez que o ‘Dançando com as Diferenças’ participa do evento. A primeira vez aconteceu no ano de 2005, em Piracicaba, São Paulo. A professora doutora Mara Antunes diz que a oportunidade de se apresentar além fronteiras é ímpar para ter contato com a apresentação de diferentes grupos. “Para nós todos é muito bom ver outros grupos, ver a maneira como eles trabalham, isso é fantástico!”, diz Mara.
Fabiele dos Santos, 14 anos, é uma das mais antigas participantes do projeto: está dançando sobre rodas há cinco anos. Uma garota retraída à primeira vista, mas risonha e extrovertida. “Ela era um bicho do mato antes de entrar no projeto”, brinca a mãe de Fabiele, Zeli Maria dos Santos. “Agora, ela adora conviver com os outros jovens, principalmente aqueles na mesma situação dela. A Fabiele, agora, é muito independente; ela é mais feliz.”, conta Zeli.
Os benefícios que esta atividade pode trazer para melhorar a qualidade de vida dos deficientes físicos são muitos. A dança é a forma mais intensa de expressão corporal, é a manifestação dos sentimentos, na qual a alma se exterioriza. É a descoberta do movimento, e é através dele que é possível comunicar-se com o mundo. Afinal, é preciso ler a dança com todos os sentidos. Não basta apenas ver.  É preciso sorver, ruminar, inspirar, acariciar, pulsar, sentir. Sentir com todos os poros.

Professores e participantes descontraídos construindo a pose final. Créditos: Gabriela Moraes.
Para alçar vôos ainda mais altos, falta um certo pó de pirlimpimpim a esses jovens valentes. Sim, aquele pozinho mágico que fazia com que os personagens do Sítio do Pica-Pau Amarelo fossem transportados para uma outra realidade. Queria que esses jovens valentes ganhassem uma pitadinha desse pó. Pozinho chamado reconhecimento.
Repórteres:
Gabriela Belnhak Moraes – gbelnhakmoraes@hotmail.com
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Professor responsável: Rondon de Castro – rondonhamartia@gmail.com
3º semestre
5/6/2010
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