Conheça Rogério Amaral...

   

   Me chamo Rogério Amaral, tenho 38 anos e moro em Caranaíba, uma pequena cidade do interior de Minas Gerais. Conheci o blog e gostei muito, passei a ser um leitor assíduo. Assim sendo, gostaria de contribuir com minha pequenina história.
   Aos dois anos de idade, sofri poliomielite, a qual me deixou tetraplégico. Durante quase três anos, fiz tratamento intensivo no Hospital da Baleia em Belo Horizonte. O resultado foi fantástico, recuperei parte dos movimentos, ficando apenas paraplégico. Continuei o tratamento por mais seis anos, mas não obtive maiores resultados, ficando estabilizado.
   Nesta época, minha família não tinha condições financeiras, para comprar uma cadeira de rodas, então tive que adaptar-me, e aprender a  me locomover de alguma forma. E assim, comecei a interagir com as crianças da minha idade. Às vezes, achava meio estranho ver os outros colegas andantes e eu não, mas não me importava muito, pois sempre estava com eles e participava de todas as brincadeiras, como jogar bola, andar de carrinhos, ir aos rios para nadar e etc.
   Tive uma infância maravilhosa, de fato inesquecível. Mas as coisas começaram a mudar. Aos sete anos como qualquer outra criança, minha mãe efetuou minha matrícula na escola pública da cidade. Por não ter a cadeira de rodas, ficou mais difícil! Minha mãe me levava nos braços até o colégio. Nos primeiro dias, sentia um certo constrangimento, ao entrar e sair da sala, ao ir ao banheiro, pois tinha muita gente e apenas eu era diferente, assim eu pensava.
   O tempo me fez acostumar e novamente voltei a me adaptar com a situação. Rapidamente se passaram  quatro anos. Estava ansioso para entrar no colegial, quando comecei a estudar a noite. Por incrível que pareça foi mais fácil! Passavam Kombis escolares públicas, em frente à minha casa e me levavam e traziam do colégio. Isso facilitava meu deslocamento, até porque eu já estava me tornando um adolescente, ficando mais difícil para ser carregado nos braços por minha mãe.
   Tudo era novidade no colégio: novos professores, novas matérias, novos amigos... Mas, eu não sabia de fato o problema que estava por vir. Foi quando completei meus treze anos mais ou menos. Nesta época os amigos já começavam a sair à noite, a ir aos bailes, aos bares e eu não tinha como ir com eles. Na segunda feira no colégio, o assunto entre eles, já não me cabia. Ouvia eles dizendo o quanto de coisas boas tinham feito, até mesmo as namoradas que arrumavam. E eu, sem assunto, pois tinha ficado em casa, fazendo outras coisas, porém, sozinho.
   Aquela situação começou a me fazer ver um outro mundo, o qual eu não imagina que iria acontecer. Comecei a discriminar a mim mesmo, me sentia diferente de toda forma. Cada dia me sentia pior e comecei a me afastar mais e mais de todos!
   Decidi não estudar mais. Minha mãe sem entender, perguntava-me todos os dias, porque eu tinha parado. Simplesmente respondia que já estava bom, eu já tinha aprendido a ler e escrever e por quase um mês eu não fui à escola. Com isso, alguns professores sentiram minha falta, e foram na minha casa. Por horas conversaram comigo e conseguiram convencer-me a voltar.
   Voltei e continuei até o final do primeiro grau,  porém,  minha relação com os amigos tinha mudado muito! Eu não tocava nos assuntos que me machucavam e eles também não falavam mais perto de mim.
   Já com quase 15 anos, recebi uma oferta de trabalho, na prefeitura da minha cidade. Eles tinham aberto uma central telefônica e me chamaram; obviamente aceitei. Aquilo foi tudo que precisava, pois vi, que podia fazer algo de útil! Comecei a ver a vida de outra forma, passei a ter meu próprio salário... e assim, pude comprar minha primeira cadeira de rodas, que me deu o poder de ir e vir com mais independência.
   Foi uma adaptação fantástica, rapidamente já a dominava para todas as situações. Foi nestes momentos que percebi que eu poderia ir mais longe, então me matriculei para o segundo grau.
   Os finais de semana mudaram, pois eu tinha dinheiro para sair e tinha minha cadeira que me levava a todo lugar. Percebi que não era de fato diferente de ninguém, eu apenas precisava de uma forma diferente para me locomover. 
   Comecei a analisar todo mundo que estava ao meu redor, e vi que alguns amigos não tinham emprego, eu tinha. Então entendi que todos nós passamos por momentos difíceis. Passei a entender o quão a vida era um desafio, porém ,de forma diferente para cada um.
   Continuei o ritmo, concluí o segundo grau, e ao mesmo tempo, haveria um concurso na prefeitura. Então decidi  fazê-lo e optar por outro cargo. Por sorte passei e passei a trabalhar na parte  burocrática administrativa.
   Mas  ainda estava insatisfeito, pois queria fazer minha faculdade, porém, meu salário não cobria as despesas. Me dediquei ao trabalho até ser reconhecido e promovido. Passei a ser tesoureiro, cargo com maior responsabilidade, bem como salário maior. Desta forma pude fazer o vestibular. Passei e logo comecei a faculdade, fiz Ciências Contábeis.
    Atualmente continuo trabalhando na prefeitura, ocupando o cargo de superintendente de finanças. No decorrer dos tempos conheci milhares de pessoas, e percebi o quanto é maravilhoso viver! Adoro viajar, sair com amigos, não perco minhas baladas, meu futebol aos domingos, frequentando estádios e tudo mais. Conheci mulheres interessantes, das quais com uma delas tenho minha filha, que completa este ano, oito anos de idade.
   Aprendi a viver e conviver com todas as situações. Só lamento não poder viver mais cem anos. 
Sou eternamente grato a minha família e em especial a minha mãe, que me deu toda força para eu chegar onde cheguei. Bem, minha cadeira de rodas, jamais a largaria hoje por qualquer outro motivo, ainda que descobrissem a cura da paralisia, pois seria covarde se a abandonasse, porque tudo que conquistei,  por que todos os lugares que conheço foi em cima dela.
   E jamais poderia deixar de dizer o quanto agradeço a Deus por essa vida maravilhosa! A vida é um picadeiro de circo e quem nele se apresenta, é um verdadeiro artista!

Rogério Amaral
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