Dose extra de coragem


Uma lesão na medula, no auge da juventude, deixou a empresária Andrea Schwarz paraplégica da cintura para baixo. Ser cadeirante, porém, nunca foi empecilho para engravidar duas vezes e curtir cada etapa da vida dos filhos

Heloísa Noronha

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Andrea nunca faz da sua condição um impedimento. Trabalha muito, reserva um tempo somente para as crianças e tenta deixar tudo sempre mais divertido: quando passeiam, não raro as crianças sentam-se no colo dela e vão em frente
Uma das grandes emoções da gestação é perceber os primeiros movimentos do bebê dentro da barriga. Para a empresária paulistana Andrea Schwarz, 35 anos, a gravidez do primeiro filho, Guilherme, 5, trouxe um “brinde” tão intenso quanto os chutezinhos: sentir, novamente, as pernas. Como se diz no mundo da gravidez, foi tudo “culpa dos hormônios”. Em 1998, Andrea ficou paralisada da cintura para baixo, devido a uma má-formação congênita na medula espinhal. Nunca se soube a razão, tudo aconteceu em um mês. Corajosa, seguiu em frente, em busca de realizar seus sonhos – gerar uma criança estava entre eles. “Sempre quis ser mãe e então comecei a pesquisar sobre como era a gravidez de mães cadeirantes”, conta.
A decisão de engravidar foi compartilhada com o publicitário Jaques Haber, 34, que já namorava Andrea na época da lesão. Aconteceu quando eles tinham quatro anos de casados. Além dos cuidados convencionais de pré-natal, a obstetra monitorou a maior propensão da paciente a infecções urinárias, doença típica de pessoas cadeirantes (devido à mesma posição por muito tempo) e ministrou medicamentos para a circulação, injetados na própria barriga, para evitar trombose.
O parto foi um capítulo à parte: seria impossível Andrea ter o normal e a cesárea também oferecia restrições pelo fato de a anestesia ser aplicada na coluna. As alternativas seriam tomar a geral, ou encarar a cirurgia a sangue-frio – conforme a médica fosse realizando o corte, um anestesista injetaria medicação local para controlar a dor. “Era meu primeiro filho e eu queria muito vê-lo saindo da minha barriga. Escolhi a opção mais difícil e pensei que fosse desmaiar no momento em que ela o puxou. Mas foi recompensador.” E ela repetiu a experiência para dar à luz Leonardo, seu segundo filho, hoje com 3 anos. Os meninos são saudáveis e de uma energia contagiante.
Tudo pelos filhos Andrea e Jaques sempre gostaram muito de sair e viajar e escreveram juntos dois guias de turismo para portadores de necessidades especiais, o Guia São Paulo Adaptada (O Nome da Rosa) e o Guia Brasil para Todos. Há 11 anos fundaram a i.Social, consultoria com foco na inclusão social e econômica de quem tem deficiência, que já atendeu cerca de 250 empresas e empregou mais de 8 mil pessoas. O trabalho é uma das paixões de Andrea, que organizou a rotina para dar conta do tempo com os filhos. “À noite, sou só deles, e tudo o que consigo com o fruto do meu trabalho é destinado para as nossas viagens.” Para ajudar a administrar as demandas domésticas, o casal conta com uma empregada e uma faxineira.
Sair de casa é um desafio. Não pela disposição de Andrea, mas porque as cidades ainda não são preparadas para cadeirantes mães. A maior reclamação dela é em relação aos banheiros de restaurantes e shoppings: há os para cadeirantes, mas nunca um espaço para elas no específico para crianças. Na hora de viajar, ela sente que as pessoas raramente imaginam, por exemplo, um quarto para família com uma mãe cadeirante.
Nada disso muda o jeito com que os filhos encaram a condição da mãe. Certa vez, os amigos da escola de Guilherme comentaram que Andrea era diferente, pois não andava. O menino devolveu no ato: “Minha mãe não anda. Minha mãe voa!” Uma metáfora mais do que apropriada para uma mulher que se reinventou, só que sobre rodas.

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