Conheça Guilherme Costa...


 Meu nome é Guilherme Costa, tenho 24 anos e sou amazonense. Começando do início, porque minha história tem vários inícios e recomeços, nasci uma pessoa "normal" (se é que isso existe) e me mudei para Brasília aos 2 anos de idade. Foi lá que o curso da minha vida tomou rumos adversos, quando tinha 14 anos fui atropelado por um carro a 105 km/h, de acordo com a perícia policial, e tudo ficou denso e meio cinza a partir daí.

Dentre tantas interrupções, entretantos, poréns e outras situações, eu estou vivo e bem vivo! Não quero que nossa conversa pareça algo clichê ou não fuja os padrões, desculpem-me, mas eu gosto de coisas novas.


Costumo dizer que algo novo sempre assusta no primeiro contato, mas depois passa a ser algo corriqueiro e natural, voltando a história, antes da lesão eu já era muito ligado a esportes e queria ser jogador de futebol e entre todas as dificuldades que estava vivendo naquele momento ainda tinha esse agravante.

Doeu muito, me vi sem chão e mesmo se tivesse chão de novo não teria mais o movimento das pernas (eu pensava assim na época), mas apesar de tudo não fiquei revoltado, não tive raiva, afinal como disse anteriormente havia sobrevivido a um acidente gravíssimo, porém não via perspectivas para o futuro.

A vida às vezes é muito dura. Ela cobrou de uma criança de 14 anos a maturidade de um adulto. Escolhi ser forte e ser fortaleza dentro de mim, vendo meus familiares e amigos ao meu lado, não poderia ter o luxo de estar triste. Nesse momento comecei a perceber as coisas ao meu redor, a vida me parou para ensinar que ela era muito além do meu mundinho até então, tudo ao meu redor, apesar de ser um momento crítico e tenso, era amor e doçura, tudo e todos cuidavam de mim com atenção e generosidade.

 Depois de um tempo recebendo essas doses diárias de amor, como que de forma natural eu quis devolver amor para o mundo, apenas por gratidão.
O mundo me impôs uma situação completamente adversa, mas ao mesmo tempo me proporcionou uma visão de que o mundo pode e é um gerador de amor.

Depois de ter passado o ápice da tormenta, fui para a Rede SARAH para reabilitação. Uma nova fase dentre as tantas novas fases se iniciara e com ela um choque: não voltaria mais a andar. O menino sonhador que queria ser um jogador de futebol estava à deriva num mar de incertezas.

 Na rede SARAH conheci um mundo novo, um mundo invisível e ao mesmo tempo estampado na nossa cara, somos milhões de deficientes Brasil a fora e agora estamos começando a criar voz.
Lá conheci diversas histórias, vi e convivi com diversos tipos de deficiência e todo tipo de gente. Me ofereceram o tênis de mesa como forma de reabilitação, no primeiro momento relutei muito e chorei. Queria minha vida de volta. Queria acordar daquele pesadelo. Até que me convenceram e resolvi tentar o tal do Ping pong.

Na primeira vez me falaram que eu levava jeito e me indicaram um cara em Brasília, Zé Ricardo (meu técnico até hoje) caso quisesse treinar um dia. Não quis, no primeiro momento, tudo ainda estava se encaixando na reconstrução de minha nova vida, mas exatamente um ano depois do acidente, no meu primeiro aniversário de lesão pedi pra minha mãe para fazer um esporte senão enlouqueceria. Tinha o ímpeto de desportista, mas tinha principalmente uma vontade de ficar um pouco só, sempre havia muita gente ao meu redor, por isso aceitei tentar um esporte individual, brinco que sempre fui meio "lobo solitário".

Então, comecei a treinar tênis de mesa duas vezes por semana e fui jogar meu primeiro torneio nacional, copa Brasil ficando em 3º lugar. Duas vezes na semana viraram três, que viraram todos os dias que viraram 3 horas por dia que virou uma profissão, que virou uma paixão!

Com um ano e meio treinando fui convocado pela primeira vez pra seleção brasileira juvenil e fui jogar na Colômbia, e de lá voltei com 2 ouros e uma prata, no mesmo ano fui convocado para seleção adulto pela primeira vez e de lá graças a Deus não sai mais.

Já se passaram oito anos desde que comecei a jogar, já foram 15 países conhecidos, fora os que fui mais de uma vez (Alemanha, Costa Rica e EUA 3 vezes cada um e Eslovénia 6 vezes e por aí vai).


Rodei muito pelo Brasil também e muito vivi dentro do esporte paralímpico. Devo muito a ele, não só como atleta, mas principalmente como pessoa. Minha independência devo a esse "curso superior da vida" que o esporte me deu, o aperfeiçoamento do meu inglês e espanhol também e por ultimo e talvez o mais importante devo a conquista do “meu foco”, saber exatamente o que preciso fazer para alcançar meu objetivo.

Agora depois de oito anos, sou Tetra campeão Brasileiro, campeão Parapanamericano, campeão Parasulamericano (classe2) e estou vivendo uma reformulação na minha vida porque me classifiquei para as Paralimpiadas do Rio 2016.

Nos últimos 3 anos estava treinando cerca de 5 a 7 horas de segunda a sexta e esse ano após me classificar percebi que estava na verdade imerso numa zona de conforto e estava fazendo pouco. Estava fazendo aquilo que me mandavam e não indo atrás do meu sonho.

Como na minha vida nunca consegui nada fácil e como já falei, sou movido a desafios resolvi entrar nessa de cabeça. Estou trabalhando agora não só técnica, mas corpo, mente e estratégia para chegar nas Paralimpíadas no meu auge, preparado no tudo e no todo. Treinando, melhorando condicionamento, estudando a mim e a meus adversários, me aprimorando como atleta e ser humano.
Percebi que sou muito maior do que imaginava e que viver um momento de vulnerabilidade me fez crescer em vários outros aspectos do meu ser. Meu único objetivo é me preparar da melhor maneira possível para não chegar lá com um gostinho de " e se..."ou com aquele gosto amargo de que poderia ter feito mais.

Vou honrar cada Maria, cada João, cada Pereira, cada Silva ou cada Costa desse meu lindo país. Em um momento de tantas incertezas e crises, afirmo com fervor, que de nós atletas paralímpicos só haverá motivos para se orgulharem. Eu me orgulho de carregar todos vocês na minha camisa, no meu peito.
Do seu querido servo, ó pátria amada!

Guilherme Costa

Atleta da Seleção Brasileira Paralímpica de Tênis de Mesa
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